19 setembro, 2005

experiência

Se existe algo que não se explica são as tardes de domingo, tardes ensolaradas em que, logo após o almoço, o tempo se espreguiça lânguidamente em uma cadeira de praia ou à beira de uma piscina qualquer, e, aproveitando os raios de sol, adormece até parar.
Descobri isso numa dessas tardes, após ler o jornal e antes de desistir de aparar a grama , quando, de sopetão, o telefone toca trazendo o convite para um chopp vespertino e talvez uma partida de truco num bar da cidade . Chave do carro, carteira e o dinheiro que se esvairá , junto com a tarde , em líquido dourado e porções variadas de tira-gosto, estou pronto, me fui.
A animação começa com o jogo de futebol na tv e aumenta com porcentagem de álcool no sangue, não digo bêbados, mas moderadamente alegres e cheios de uma expectativa que somente um gol no time adversário pode provocar, roubado, de preferência , para duplicar o prazer com a indignação alheia. Após o jogo nos mudamos para uma mesa mais próxima à rua, com a óbvia intenção de lançar olhares em direção às meninas que passam, e ,com alguma sorte, conseguir atenção.
Aí a vejo, vestindo um malha , pedalando sua bicicleta num ritmo gostoso, constante e calmo, sem pretensão, sem querer chegar a algum lugar, assim como a tarde não pretendia virar noite; sigo suas formas, seus cabelos levemente ondulados, presos num rabo de cavalo, jogados displicentemente nas costas, ali o tempo pára; entre um fio de cabelo e a espuma no meu lábio superior. Imagino um gosto doce, pensando nas formas escondidas sob a camiseta larga e molhada de suor, horas e horas a fio observando as gotas contrariarem a física , permanecendo em seu rosto, a meio caminho do queixo, próximo a boca tão desejada, brilhando contra a pele queimada do sol de todos os dias.
Ah se pudesse me mover, mas estou aqui pregado à cadeira , preso a magia das tardes de domingo, mas ah, se pudesse me mover eu teria corrido, chamando seu nome, derrubando a cerveja na mesa e, com certeza , obtendo a sua atenção, mas, com o tempo parado, minha vontade se foi em contemplação a beleza, à arte esculpida naquela forma congelada, às curvas precisas e perfeitas e à densidade da espuma no chopp , gelado , na medida, com dois dedos de colarinho.